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Natal na Campanha

Poesia Presente (2017)

Odilon Ramos

Quando o sino da igreja repica
Anunciando os festejos de Natal
Me vem logo na lembrança
O meu tempo de criança
E a história que eu vou contar

Pai Narciso era um velhinho
E já andava arcadinho
Escorado num bordão
Tinha barba comprida
Bem branquinha
Mais parecia um punhado de algodão

Carregava no lombo arcado
Um saco muito surrado
Que da sua mão não largava
Era ali naquela sacola
Que ele guardava as esmolas
Que o povo todo lhe dava

Ninguém por ali sabia
Quanto tempo já fazia
Que o velhinho apareceu
Naquele rosto enrrugado
Naquele olhar tão cansado
Sua história ninguém leu

Só sei que quando ele passava
Minha mãe logo nos chamava
E nos dizia contente
Meus filhos, papai noel vai passando
Seja bonzinho
Que esse ano ele lhe traz um presente

Eu andava inté doente
Com as ideia já quente
Pra mode um palhaço engraçado
Que eu vi naquela vitrina
Ali na loja da esquina
Num cordão dependurado

Fui correndo pra janela
Pra ver passar por ela
Aquele velho arcadinho
Corri de atrás na calçada
Peguei sua mão enrrugada
E lhe disse com carinho

Papai noel eu sou bonzinho
Fiz tudo as minhas lição
Não esqueça meu endereço
Porque eu sei que eu mereço
E o senhor sempre foi bom

Não quero pião nem bola
Nem trenzinho de mola
Nada disso eu vou querer
Quero palhaço de cordinha
Aquele ali da lojinha
Só isso eu peço procê

O vélho continuou andando
Pela calçada foi indo
Foi indo sem se voltar
Mas eu por mim
Já sabia que
O presente ele trazia
Quando chegasse o natal

O tempo foi se passando
E o Natal foi chegando
E minha mãe me chamando
Meus irmãoszinhos também
Me alembro bem
Ela nos disse chorando
Meus fihos eu sei que esse ano
Papai noel não vem

Só hoje que eu compreendo
Eu era muito pequeno
Nove anos e um pouco mais
Nunca tinha imaginado
Que um pai desempregado
Muito quer mas nada faz

Por fim a noite chegou
Minha mãe muito chorou
Quando foi pra nós deitar
Eu tava inquieto esperando
Que o dia fosse chegando
Pro meu palhaço pegar

Mas quando acordei
Foi chorando que eu vi
Que naquele ano
Papai noel me enganou
Na sandalhinha furada
Nem o palhacinho, nem nada
Pra consolar minha dor

Fui correndo pra janela
Queria ver passar por ela
Aquele velho malvado
Queria que ele soubesse
Que a gente nunca se esquece
De um presente a desejar

Mas no meio da calçada
Enfrente a porta de entrada
Um vulto eu fui enxergar
Pai Narciso tava estendido
Encolhidinho, gelado
Tinha morrido o coitado
Bem na noite de Natal

Tava assim jogado pra um lado
O velho saco arrebentado
Na outra banda o seu bordão
E o meu palhaço engraçado
Num cordão dependurado
Tava ali na sua mão

Daquele dia em diante
Não pensei mais um instante
Num presente a receber
Agarro sempre a me alembrar
Que eu vi papai noel morrer
Eu vi papai noel morrer
Bem na noite de Natal


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