Num Dia de Mormaço
Minha Origem, Meu Canto (2018)
Fernando Saccol
Junto às barras do infinito, mais um dia vem surgindo
O sol já nasce branindo com seu entono machaço
Vermelho que nem as brasas de um pai de fogo de aroeira
Templando o céu da fronteira com previsões de mormaço.
Templando o céu da fronteira com previsões de mormaço.
O rodeio lá dos fundos tem bicheira e carrapato
E cedo entra para o mato quando o sol quente carrega
Mas hoje é dia de banho e o índio bueno e campeiro
Não deixa nenhum terneiro escondido nas macegas.
Não deixa nenhum terneiro escondido nas macegas.
A cachorrada da estância campeia água da sanga
E Don Ezíbio arremanga sua bombacha inté o joelho
Mete o cavalo, abre o peito: Ó, o buraco, bicho fraco!
E o sol vindo mais um naco, vem sapecando parelho
E assim o rodeio emboca arrastando em meio a poeira
Uma zebua caborteira que vem pisoteando a cria
Berrando e cheirando a terra atropela na cuscada
Que vem, que vem latindo assolheada com o sol do meio-dia
O calor que vem debaixo se mescla ao que vem do céu
Parece que um fogaréu vai levantar sobre as pedras
Queimando o couro do índio que pisa o chão da mangueira
Guasqueando a sina campeira que Deus lhe deu por ser quebra.
Guasqueando a sina campeira que Deus lhe deu por ser quebra.
E quando o mormaço brabo vai calmando ao despacito
A tardinha vem no grito de algum tajã do banhado
Que abre as asas pachola onde o céu se adelgaça
Medindo quase uma braça no horizonte encarnado.
Medindo quase uma braça no horizonte encarnado.
Coisa feia é mormaceira que aquebranta carne e osso
Castigando o índio grosso que sente um peso na estampa
Dá inté pena da alma que parece mais miúda
Quando a empreitada graúda mescla poeira, casco e guampa.