A Delicada
Barulho de Campo (2017)
Joca Martins
Mal amanhece lá fora.
Foi gelada madrugada!
No silêncio desta geada
Não cabe o som da tua espora.
Foi pouca a tua demora,
Mas a minha noite te viu
E o poncho que me cobriu
Te faz falta campo fora.
Por onde andarás agora
Por este mundo de frio?
Beijo o poncho que me abriga
E descubro por onde tu andas.
Pelo cheiro das pitangas,
Numa ponta de restinga.
Numa canhada florida,
Pelo aroma da manhã.
Anda agarrado na lã
O perfume da tua vida.
Nestas fragrâncias sentidas
Entre poeira e picumã.
O cheiro do teu gateado
Está pegado a baeta.
Suor de anca e paleta
Onde o poncho vem armado.
Traz aromas de banhado,
De marcela e de alecrim.
Cheira a mel de camotim,
Cheira a melão de cercado.
Onde cruzas , meu amado,
Teu poncho fala pra mim.
Tem frescor de “ocalito”,
Olor de fogão tropeiro,
Fumaça, brasa e palheiro
E o asseio d‘um ranchito.
Mas que mundo tão bonito,
O teu poncho me reserva!
No aroma da tua erva,
Tão pouco e tão infinito.
Quando levares teu poncho,
Jamais andarás solito.
Depois do frio e da geada,
Ainda vem chuva e tormenta.
Sem poncho ninguém aguenta
No fundo das invernadas.
Voltas numa madrugada,
Para buscar o teu calor.
Levas bem mais que uma flor
Na baeta perfumada.
No fio da lã entranhada,
O cheiro do nosso amor.