Rancho de Luz
De Bom Gosto (2006)
Jean Kirchoff
(carlos omar villela gomes/gibão strazzabosco/túlio urach)
Sentado à mesa, o mate novo
A vela acesa, o olho turvo
Ouço mil cascos em disparada
Lá por detrás da coxilha
E o negrinho gorjeia seu riso
Por ter achado a tropilha
Dou-te o lume da vela, a prece prometida
Encontre minha alma que anda perdida
A escuridão da noite ainda me traz
Espíritos que vagam sem ter paz
Aquerenciando o temor de encontrar
Lá fora, o fogo insensato do boitatá
São índios e padres
São negros, mulheres, soldados
Que adentram o rancho
E mateiam, proseando ao meu lado
Guiam-se pela prece
Aos braços abertos na cruz
Enquanto a vela aquece
Os sonhos que povoam
Esse rancho de luz
Indago o cristo na parede
Se pode o mate aumentar a sede
Na chama da vela que se desfigura
Vejo o campo e, nele, ecos de loucura
Faíscas de adagas, a morte estampada
Tempo das batalhas, de morrer por nada
Murmúrios engasgados em pecado e dor
Clamam, ao meu lado, a mão do redentor
Roque na fogueira, sem o coração
Toma minha prece como extrema-unção
O aço de latorre vem pedir perdão
Da fúria da 'criolla', no sangue, nas mãos
São índios e padres...
Dou-te o lume da vela, a prece prometida
Dou-te o lume da vela, a prece prometida