O progresso e o tempo novo mataram os rebanhos
As comparsas de esquila a martelo
O brete, o rodeio e as marcações porteira afora
O rádio emudeceu as vitrolas
E o caminhão matou o tropeiro
E o homem
E a mulher
Ah,
Estes ainda não
Os homens e mulheres deste pago
Estão como cernes de guajuvira
Eretos e firmes
Como sempre
Nas suas almas
Está guardada
A melhor fibra da raça crioula
Mantendo como patrimônio maior
A honra, a dignidade, o apego ao chão
O trabalho duro e honesto
A gente do meu rincão
Sabe arrancar deste solo
O seu sustento suado
Crescemos...
Crescemos tranqueando
Atrás do arado
E conversando com os bois
Por isso, o braço forte
As mãos, a alma e o coração
Calejados pelo trabalho pacífico
Conduda que adquirimos
Pelos ensinamentos dos nossos anteriores
Que balizaram rumos pra nós
Montaram a cavalo para defender
E tornar brasileiro
O chão em que pisamos
Que guarda as suas cinzas
Aqui,
As nostalgias da campanha
Encontram amparo nas cruzes sozinhas
Quando debruçam às sombras
De braços abertos
Sobre a teimosia dos parronais
Sobre essas imagens
É que a saudades ganham estatura
De cerros
Aqui,
Repartimos a dor em silêncio
Porque a alma quando está ferida
Substitui as palavras
Pelo idioma do coração
Aqui,
As sombras dos cinamomos
É muito mais que uma sombra
É o lugar
Onde comungam os mansos e chucros
Remoendo tranquilos nos sóis dos verões
A ceiva natural dos campos
E onde as espécies se igualam
Celebrando a vida ao redor das casas
Apenas aqui
O andante descobre
O valor de um "oh de casa"
Quando soado de corredores
Bate palmas de esperança
Na frente do parapeito
E as portas, as portas se abrem
Para ouvir os seus relatos
Colhidos nas estradas
Aqui,
A cordeona tem vozes
De recuerdos
A guitarra
Tem alma de pátria e querência
Os galos acordam as madrugadas
E o cheiro dos campos
Vem dormir dentro de casa
Aqui,
Se conhece a volta certa
Dos cambões das porteiras
E se entende de laços
Arames e tranças
De potros e domas
Conjuntas e jurros
Arados e enchadas
Mariposas e galiotas
Machados e tiradeiras
Aqui,
As mangueiras encerram
Os tombos dos pealos
E os comandos de
"forma cavalo"
Os berros das vacas mansas
Timbram a alma do pago
Com refrãos enluarados
De madrugada
Apenas aqui
Ainda se ouve
Nas tardes quentes de chuva
O tuco-tuco justificando seu nome
E as caliandras ainda encontram
Varais com charque
Para temperar o assoviu
Nas noites quentes
Ainda se escuta a saparia
Afianda um canto
Na chaira dos juncais
As esporas
Ainda riscam o chão dos galpões
E as botas
Tem o couro marcado
Pelo suor dos cavalos
As chaminés dos fogões a lenha
Ainda fumegam pelas madrugadas
E ainda se pode ouvir
As cantigas das sangas claras
Os berros de touro
E a cantoria dos grilos
As babas de boi
Tremulam nos caranguatás
Asteando em mastros de espinhos
Os rumos dos ventos
Aqui,
Ainda se podem ver bombachas remendadas
E camisas feitas de saco
Estendidas num quarador
Próximo a tábua de bater roupas
Nos empedrados das sangas
As mulheres
Ainda usam sombrinhas
Lenços na cabeça
Para a lida
E ainda bordam panôs
Aventais, guardanapos
E ainda fazem pão com torresmo
Aqui,
A sabedoria secular
Ensinou que se fazendo uma cruz
Com carvão sobre os ovos, de galinha
Para chocar
Os trovões não conseguem gorar
E a natureza se encarrega de descascar as ninhadas
E espalhar infâncias de veludos
Nos terreiros bem varridos
Aqui,
Ainda se usa o macete
E a mordaça para sovar o couro
E se toma café com bolo frito
Nas tardes chuvosas
De inverno
A cicatriz dos rodados
Que nascia nas cacimbas
Hoje serve de caminho
Para a sobra dos aguaceiros
Engordar as enchentes
As vezes o céu pinga
Pelas goteiras dos nossos tetos
Apaga lua e estrelas
Mas acende em cada um
A sabedoria
E a esperança
Aqui,
A felicidade
Não tem anéis nos dedos
Nem diplomas nas paredes
Mas se tem olhos da alma
Capazes de interpretar
As parábulas da natureza
Porque sabemos
Que o canto matinal dos bem-te-vis
É um diálogo com Deus
Ato de deslanar ovinos; no que tange a caprinos e caninos o termo é tosquia e no que respeita a aparar crina de eguariços o termo correto é tôso.
Reunião para cuido, que se faz do gado.
Espaço seccionado numa cerca.
Apero em aço com cabo de madeira, osso ou chifre, que serve para amolar e assentar o fio de utensílios cortantes.